Golpistas se aproveitam do mercado de vendas
pela internet e oferecem produtos que não são entregues.
Os depoimentos são de vítimas
diferentes, mas ajudam a contar a mesma história. “Estava fazendo pesquisa em
um site de pesquisas de preço e encontrei essa loja. Acreditei que o preço
estava bem em conta porque eles pediam para pagar em boleto bancário”, diz uma
mulher.
“Boa reputação e boa
recomendação. Fui pesquisar os dados dele na Receita Federal, dados bancários,
tudo ok. Depois de mais uma semana mais ou menos, entrei em contato de novo, o
telefone começou a dar que não existia mais”, conta um homem. “A gente procura
o mais barato, mesmo com pouca diferença. No outro dia eu fui lá, não tinha
nada. Paguei à vista, R$ 799”, explica outro consumidor que foi prejudicado. “Passaram
esses dez dias, eles desligaram os telefones e ninguém do Brasil todo conseguiu
falar com eles”, lembra mais uma pessoa. Todos são vítimas de uma mesma fraude
na internet: pagaram por produtos que nunca foram entregues.
Os golpistas se aproveitam de
um mercado que só cresce no país. Só no ano passado, mais de 24 milhões de
brasileiros fizeram compras online. E, no primeiro semestre de 2012, o setor
faturou mais de R$ 10 bilhões. A denúncia dos consumidores enganados levou a
polícia a uma quadrilha especializada nesses golpes. Você vai ver em detalhes
como agiam os estelionatários. Montavam sites falsos, ofereciam de tudo e não
entregavam nada. Para desmascarar a quadrilha, o Fantástico caiu, de propósito,
no golpe virtual. No dia 22 de outubro, compramos uma câmera fotográfica em um
dos sites da quadrilha, por R$ 406. Segundo a pessoa que atendeu ao telefone, o
prazo de entrega seria de dez dias úteis, mas o produto chegaria antes. A
página tinha três telefones de contato: um em Palmas, no Tocantins, um em São
Paulo e um no Rio. Mas todas as ligações caíam no mesmo endereço: uma mansão em
Palmas (TO). Fomos atendidos por Washington Marques Carneiro, que garantiu que
a compra era segura. “Estamos há mais de um ano no mercado e queremos continuar
muito tempo”, afirma Washington.
Segundo a Polícia Civil de
Goiás, eles agiam havia dois anos. Já tomaram mais de R$ 2 milhões de vítimas
de vários estados. No dia em que foi comprada a câmera em São Paulo, a equipe
do Fantástico, ao mesmo tempo, acompanhou a movimentação da quadrilha, a mais
de 1.700 quilômetros de distância. A informação era de que a quadrilha tentaria
sacar o dinheiro do golpe.
Os dois chefes do grupo chegam
em uma Mercedes. Franco Douglas Andrade Castro acessa a conta no caixa
eletrônico. E Washington, aquele que atendeu ao telefone, procura a gerente do
banco usando um nome falso. Em uma gravação, Washington encomenda carteiras de
identidade falsas.
Washington – Você mandou fazer o do Marcelo, né?
Homem – Foi.
Washington – Você mandou fazer com a sua cara ou com a do Lampião?
Homem – Lampião.
Washington – Podia pegar esse outro do Giovane e fazer sua cara, não? E já deixava as duas prontas.
Homem – Foi.
Washington – Você mandou fazer com a sua cara ou com a do Lampião?
Homem – Lampião.
Washington – Podia pegar esse outro do Giovane e fazer sua cara, não? E já deixava as duas prontas.
Todos os endereços usados
pela quadrilha para abrir as contas bancárias são falsos. Em um deles, por
exemplo, deveria ser a residência de um dos integrantes do grupo. Mas, na
verdade, o que funciona no local é uma escola municipal. Nos dias seguintes, a
equipe do Fantástico continuou no shopping em Palmas (TO). Meio-dia e meia é o
horário no qual a quadrilha costuma ir ao banco para sacar o dinheiro do golpe.
Eles foram várias vezes. Segundo a polícia e o serviço de inteligência dos
bancos, eles tentavam sacar R$ 360 mil, tudo de uma vez. Mas o dinheiro já
estava bloqueado pela Justiça. Em outro telefonema, Washington relata a
conversa com a gerente do banco. “Ela falou ‘Marcos, pode procurar seus
direitos, fazer o que você quiser. Não tem tempo determinado para desbloquear
essa conta’. E ainda deu um sorrisinho, ‘bota o burro na sombra’, falou desse
jeito”, conta ele, rindo. Em outra gravação, Washington atende a uma das
vítimas do golpe, que quer o dinheiro de volta. “Essa loja não vai me entregar
o material, que eu já estou sabendo. Eu vou fazer o seguinte: não é uma ameaça,
mas simplesmente eu vou ter que tomar uma ação”, diz a vítima. “Eu não sei nem
o que você está falando”, responde Washington. Os golpistas gastavam o dinheiro
das vítimas em automóveis caros, casa de luxo e até passeio de helicóptero no
Rio de Janeiro. Faziam graça com a fortuna fácil. E chegavam a montar vídeos
para exibir a boa vida. “Era uma quadrilha muito bem organizada. No site, tinha
o telefone da suposta empresa, que, na verdade, só existe no papel”, conta o
delegado Valdemir Pereira da Silva. Na semana passada, a polícia prendeu seis
integrantes do grupo: Franco Douglas Andrade Castro, Jefferson Cristiano dos
Santos, James Muller Andrade Castro, Marcelo Chavez Vanderley, Karmenvanda
Soares Martins e Priscilla Maurício Pires.
Parte da quadrilha foi presa
na casa de 900 metros quadrados, em Palmas, que também servia de escritório. Foram
encontrados muitos celulares, computadores, máquinas de pagamento com cartões
de crédito e débito e vários documentos falsificados.
Washington Carneiro, aquele
que atendeu ao produtor do Fantástico, está foragido.
Em depoimento, Jefferson dos
Santos admite que sabia das fraudes. “Eu sabia que eles falavam de site, mas
que eles montavam assim... Tanto que me convidaram, já me convidaram para
atender ao telefone”, conta Jefferson. Jefferson usava documentos falsos para
abrir empresas e contas em bancos. Em uma agência, ele disse que se chamava Marcelo.
Jefferson confessa que sabia
dos golpes: “Eu sabia, entendeu? Me prometeu R$ 5 mil, mas só me deu R$ 1.500
para abrir essas contas para eles”. Franco Douglas foi preso num apartamento.
Com eles a polícia encontrou comprovantes de pagamento das vítimas. O delegado
Valdemir Pereira da Silva revela que a quadrilha montou vários sites. “Quando a
vítima descobria que caiu em um golpe, a quadrilha imediatamente retirava o
dinheiro da conta bancária e logo em seguida abria um novo site. E assim por
diante”, afirma o delegado. Para a polícia, o grupo pode ter criado mais de dez
sites fraudulentos. Dois já foram identificados: New Best Shop e Free Shop
Informática. Eles estão fora do ar. Segundo as investigações, o dinheiro dos
golpes era aplicado em uma loja de perfumes no maior shopping de Palmas (TO). O
objetivo era lavar o dinheiro sujo da fraude. O advogado de Franco Douglas nega
irregularidades. “Meu cliente é empresário tradicional em Palmas, já antigo,
tem duas lojas lícitas”, diz o advogado Gilberto Carlos de Morais. Ele também
defende Jefferson, James, Washington e Karmenvanda. E diz que nenhum dos
clientes tem ligação com as páginas falsas. “Todos eles aqui são primários,
nunca foram presos na vida. A autoridade policial vai ter que provar que eles
eram donos desses sites”, afirma Gilberto. Marcelo Vanderley e Priscilla Pires
não têm advogado e não foram encontrados pelo Fantástico. O grupo vai responder
por estelionato, formação de quadrilha e falsidade ideológica.
Um mês depois de comprarmos a
câmera fotográfica que nunca chegou, a loja na internet não existia mais. E,
pelo telefone, a chamada era encaminhada para a caixa de mensagens. Em um site
especializado em defesa do consumidor, as reclamações sobre compras na internet
são as mais comuns. “Este ano, nós recebemos 3 milhões e 600 mil reclamações,
sendo 700 mil reclamações só sobre lojas virtuais”, conta Maurício Vargas,
presidente do site Reclame Aqui. Mas o especialista Renato Opice Blum considera
seguro, na grande maioria dos casos, comprar pela internet no Brasil. “O
comércio eletrônico brasileiro apresenta um índice de fraudes muito pequeno e
ainda esperamos que ele continue assim. Porém, todo cuidado é pouco”, alerta
Renato Opice Blum, advogado especializado em direito eletrônico.
Preste atenção a algumas
dicas: Desconfie. Preços muito baixos e ofertas mirabolantes podem ser
chamarizes de golpe. Busque, na própria internet, o que as pessoas estão
dizendo sobre a loja. Comece procurando as reclamações! “Os resultados
positivos de forma isolada não são elementos que podem levar a uma certeza de
que aquela empresa é confiável. O consumidor deve combinar esses resultados
positivos com os resultados negativos, com as reclamações”, explica o advogado
especializado em direito eletrônico Renato Opice Blum. Se estiver visitando um site
desconhecido, compare com as lojas virtuais mais famosas. “Compare também a
política de privacidade, os termos de uso, os prazos de entrega, o formato de
devolução do produto, de devolução do dinheiro”, ensina Renato. E se perceber
que caiu em um golpe, procure a polícia.