Tudo aconteceu no fatídico dia de São Pedro (29 de
junho de 1947), padroeiro da Cidade de Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito
Santo, onde Roberto Carlos nasceu. Portanto, era festa na cidade e
como toda data comemorativa naquela época, tinha bandas tocando e muita
agitação. E, claro, Zunga (apelido de Roberto na infância) não perderia
oportunidade de ir prestigiar os festejos.
Fifinha (Eunice Solino) era a
melhor amiga do Rei, moravam na mesma rua e costumava ir àescola juntos.
Neste dia, ela foi recrutada por Roberto para ver os desfiles que agitavam a
cidade.
Naqueles tempos, Cachoeiro era entrecortado por
ferrovias e, portanto, era comum acidentes acontecerem. Lá, próximo ao centro,
entre a rua e a linha de ferro, encontrava-se as duas crianças. Enquanto
aguardavam um desfile escolar, uma professora temeu pela segurança de Zunga e
Fifinha, pois elas não perceberam a aproximação de um trem que se aproximava.
Mesmo gritando e sinalizando para as crianças saírem dali, a professora correu
e puxou a menina, enquanto um assustado Zunga recuou e tropeçou, caindo na
linha férrea – ele estava de costas para a ferrovia. Como não dava mais tempo,
a professora tentou avisar o maquinista, mas já era tarde demais. A locomotiva
avançou e a perna direita de Roberto Carlos ficou presa debaixo do vagão entre
as rodas de metal.
Logo, uma multidão se aglomerava para ver o que
aconteceu. Afinal era dia de festa e provavelmente o socorro demoraria –
naqueles tempos poucas pessoas tinham automóveis na cidade. Mesmo assim
populares tentaram tirar a perna da criança, o que conseguiram com muito custo.
Graças a um rapaz que trabalhava no Banco de Crédito Real, vendo que
não dava para esperar a ambulância, ele mesmo estancou a hemorragia com seu
paletó de linho branco. Roberto Carlos nunca esqueceu dessa cena e a registrou
em uma de suas mais comoventes canções, O Divã: “”Relembro bem a festa, o
apito/ e na multidão um grito/ o sangue no linho branco” O mesmo rapaz do “linho branco” chamado Renato
Spíndola levou Zunga para o hospital (Santa Casa de Misericórdia). Dizem que a
festa perdeu a graça naquele dia. Tudo bem, que era comum acidentes, mas
geralmente eram bêbados que se acidentavam, nunca até então acontecera com uma
criança – o Zunga da rua da Biquinha.
Roberto Carlos foi atendido pelo médico Romildo
Coelho, que se tornara amigo do cantor. O acidente fez com que a perna direita
perdesse a sensibilidade, pois fora esmagada arrancando todos os nervos, por
isso a criança não chorava muito. Zunga, ao ser atendido, estava muito mais
preocupado com os sapatos novos que tinha ganhado para ir a festa do que com a
sua perna, a qual ele não tinha noção da gravidade. Na verdade, Roberto Carlos
teve muita sorte, porque era comum nestes casos amputar a perna. Mas o Dr.
Romildo era um sujeito moderno e havia lido um artigo médico que dizia que
devia-se cortar o mínimo possível os membros acidentados. Portanto, apenas entre
o terço médio e o superior da canela foi amputado e um pouco abaixo colocaram
uma roda de metal, o que impediu Roberto de perder os movimentos do joelho
direito.
Roberto Carlos passou o resto da
infância andando de muleta, e apenas aos 15 anos colocaria a primeira prótese,
quando já morava no Rio de Janeiro.
